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Monday
Feb032020

Original Bauhaus: a história por trás do objeto

POR MARIA TERESA SANTORO DÖRRENBERG
2019



 Exemplar único, série, protótipo, remake, original, cópia, produção, reprodução: Bauhaus.

Este ano, a escola de arte e design alemã Bauhaus completa 100 anos. Para comemorar o jubileu, a Alemanha festeja o inovativo centro de ideias com a exposição “original bauhaus”, inaugurada em 06.09.2019 na Berlinischen Galerie, em Berlim até 27.01.2020, apresentando 1.000 peças reunidas de museus, galerias e proprietários privados nacionais e internacionais em 1.200 metros quadrados da galeria.

Hoje tudo é um pouco Bauhaus. A forma simples e geométrica e o uso de novos materiais estão presentes nos objetos e móveis atuais, na tipografia, na arte, na cerâmica, na tapeçaria, na coreografia da dança, na arquitetura, inspirados na racionalidade e funcionalidade dos objetos e construções, na sua durabilidade, no design e na beleza da forma. Pode-se afirmar que atualmente não há nenhum campo estético em que a Bauhaus não tenha deixado marcas. Apoiada em arte e técnica, luz e cor, ritmo e movimento, os inovadores e as inovações são considerados ícones até hoje. Segundo seus mestres, entre eles Wassily Kandinsky, Mies van der Rohe, Johannes Itten, design é tudo, tudo é design. 

14 anos depois de seu início, em 1933, o nazismo fecha a escola e alunos e mestres espalham-se pelo mundo. Se a guerra matou a escola, não conseguiu matar sua alma e seu conceito de aprendizado, do exercício de experimentação mesclado ao jogo livre da fantasia. Resolvendo questões e trabalhando em conjunto, mestres, artesãos e alunos criaram e desenvolveram objetos do cotidiano, brinquedos e jogos, criaram o estilo Bauhaus, inovaram móveis e arquitetura, dentro de uma sociedade aberta e democrática, múltipla e internacional.

O objetivo do conceito da escola foi, no início do século XX, projetar peças, objetos e outros artefatos e bens com materiais simples, baratos e fáceis de serem encontrados, tornando o produto acessível a uma classe social de pessoas que anteriormente não podiam tê-los, ou seja, a ideia da produção em massa. Em outras palavras, um guarda-roupa que era anteriormente construído pelo artesão e, portanto, tinha que ser encomendado e custava caro, com o projeto da escola Bauhaus, passou a ser desenvolvido em série pela indústria, tornando-se acessível ao cidadão assalariado. Hoje, no mundo pós-moderno e capitalista, verifica-se mudanças na qualidade dos materiais utilizados, visando maior barateamento do produto e acessibilidade. Tok Stok é um exemplo. Escritórios e casas são mobiliados com sofás e poltronas projetados por Marcel Breuer, agora equipados com couro sintético e que se adequam perfeitamente ao projeto inicial. E o projeto original de Breuer, em couro e atualmente caro, acaba em algumas sofisticadas lojas de móveis e decoração.  

Sob a curadoria de Nina Wiedemeyer, do Bauhau Museums-Archiv, a exposição acompanha a filosofia da centenária escola. Ao invés da tradicional apresentação de sua arte e produção, o visitante depara-se com propostas de exercícios criativos, ou seja, ele é incentivado a vivenciar como a escola funcionava, participando dos experimentos dos alunos da Bauhaus. Muito interessante é sentar-se na cadeira de Marcel Breuer com a máscara tridimensional criada por Oscar Schlemmer para seus espetáculos de dança e sentir-se um participante da escola. O visitante pode trabalhar nas dobraduras geométricas feitas em papel que inspiraram objetos, esculturas, desenhos e tapeçaria, criando então seus próprios artefatos. Ou ainda avaliar a qualidade dos materiais para trabalhar com o design deles e criar objetos personalizados.  

Na escola, os alunos tinham aulas teóricas onde mestres discutiam seus princípios de composição. Os trabalhos dos mestres eram analisados e então os alunos eram motivados a desenhar de memória e inspirados a esboçar as próprias ideias. Para sua execução, iam às oficinas da escola, experimentando com a técnica e a mídia existentes: marcenaria, tecelagem, tipografia, ateliê de escultura, de pintura, de slides e fotografia, estenografia, teatro etc.

Fazendo parte da exposição há um livro contendo 50 exercícios históricos que eram executados no curso preparatório da Bauhaus, obrigatório para o aluno entrar numa escola de arte e design. Através dos trabalhos, o aluno era iniciado no aprendizado, na experimentação e na prática Bauhaus. O curso preparatório da Bauhaus foi conduzido por Johannes Itten, depois por László Moholy-Nagy e posteriormente por Josef Albers. O livro de tarefas pode ser manuseado na visitação ou adquirido na loja da galeria. Sob diferentes perspectivas e bem didático, ele é acompanhado de comentários, desenhos, fotos e esboços elucidatórios de como os alunos eram instruídos à filosofia da Bauhaus, seu sentido e prática. Ele oferece os meios e os métodos utilizados na época, introduzindo também o visitante na vivência da escola. O visitante também tem acesso aos exercícios dos cursos preliminares praticados na Bauhaus logo na primeira sala da exposição. Em uma estação midiática equipada com telas de projeção pode-se trabalhar virtualmente com alguns princípios de composição e design ensinados na escola.

Em suma, uma exposição sui generis, tão peculiar quanto a própria escola no pensar a arte e a técnica indissociáveis do desenvolvimento da construção e dos objetos e bens do cotidiano, atendendo o desejo de uma nova sociedade em evolução.

 

ENTREVISTA COM NINA WIEDEMEYER

A exposição “original bauhaus” fica em exibição somente na Alemanha?
A exposição “original bauhaus” ainda fica na Galeria Berlinense até 27 de janeiro de 2020. Uma itinerância em outro país não está prevista, mas sim algum aspecto ou parte da exposição. Estamos conversando e intermediando com o Instituto Goethe em Atenas e Bucareste porque a receptividade da exposição e da própria Bauhaus tem sido avaliada como especialmente inovativa e tem encantado os visitantes em Berlim.

A exposição convida o visitante a participar da experiência dos estudantes da Bauhaus dos anos 20. Qual a maior dificuldade para os visitantes da exposição fazerem essa simulação?
A estação midiática dos artistas berlinenses Syntop transferiu digitalmente alguns exercícios do curso preparatório da Bauhaus. Nessa estação, os visitantes podem testar virtualmente o que era ensinado e praticado nos cursos preparatórios. Claro que isso não é o mesmo que simular. Ensinar e aprender é um processo vivo. Assim, inspirados no curso preparatório da Bauhaus os cursos das escolas de arte atuais no mundo praticam os fundamentos da Bauhaus. O que fizemos na exposição foi tornar esses fundamentos experimentais acessíveis na atualidade e via digital.

Apesar da curta existência da escola Bauhaus, ela sobreviveu e pode-se dizer que atualmente tudo é um pouco Bauhaus. Qual a ideia ou conceito fundamental para sua sobrevivência?
Passados 100 anos, acredito que nós ainda falamos sobre a Bauhaus porque sua metodologia de ensino (teoria, inovação mais a prática) continua a nos fascinar. “original bauhaus” está interessada na herança imaterial da Bauhaus, por exemplo nos exercícios dos cursos preparatórios que eu particularmente acho muito importantes sob o aspecto social. Todos os estudantes precisavam ser aprovados nos cursos preparatórios como condição para iniciar seus estudos na escola. E quem vivencia algo em conjunto tem o espírito de grupo, é coeso e ao mesmo tempo o difunde individualmente.

O que mais a surpreendeu na pesquisa para a exposição?
Na pesquisa eu fiquei muitas vezes surpresa com a abrangência dos dados com que a escola trabalhou, ou seja, a heterogeneidade da Bauhaus. É falso afirmar que havia uma Bauhaus. Havia esoterismo e funcionalismo na escola, heterodoxos e puristas. E a Bauhaus não se resumiu a uma linha de produção, ou a uma direção de estilo, mas a uma escola com muitas pessoas de diferentes mentalidades e nacionalidades, em um período histórico muito especial entre duas guerras mundiais. Isso é o que mais me surpreendeu e que faz com que a Bauhaus continue sendo interessante, e foi o que nós procuramos transmitir na exposição “original bauhaus”.